O BLOG DA TERRA DA ROMARIA! São Joaquim do Monte-PE-

Breaking News

SALA DE LEITURA | As Águas Puras da Lajinha e suas Lavadeiras

 José Batista Neto

Foto Ilustrativa. Freepik

 

Qual seiva fortificadora, entre as serras corria um fio de água, cortando lajes de pedras que de tão mansa servia de bebedouro aos animais. No entanto, entre as serventias dessas águas, as lavadeiras de roupas aproveitavam esta corrente para cumprir o ofício.  

Com raras casas com água encanada e ainda preocupações de famílias abastadas, estas contavam com os préstimos das lavadeiras que cuidavam do vestuário. Bacias de alumínio carregadas de ternos, saias e roupas de baixo saiam na cabeça de mulheres simples, que tratavam de seguir para a Lajinha deixar tudo em ordem. Após secar, cuidavam em engomar ao ferro de brasa - não havia nessas simples residências o conforto privilegiado à época da eletricidade.  

Nos primeiros raios do dia, qual romaria em penitência, seguiam as lavadeiras em fila indiana pela picada entre árvores e cantares de pássaros. Bacias na cabeça, sabão ordinário e outros pertences numa bolsa improvisada de tecido costurado. Rumavam para um alagado livre, onde as águas das serras se empoçavam de modo a formar lavatórios. Entre conversas, fofocas e pragas iam na lida a esfregar, bater e ensaboar. O sol de dezembro ardia e reverberava nas pedras, refletindo um calor provocativo e quase insuportável. Maria era uma das lavadeiras mais jovens. Olhar trigueiro, moça bem formada, conversa suave e alegre, conduzia doces palestras a falar das coisas da vida com um tom de brincadeira peculiar.  

-Soube que o sovina do prefeito vai calçar as ruas do centro. 

-Quem disse Maria? Provocou Lourdes lavadeira. 

-Meu pai, que foi chamado para bater pedra. Respondeu Maria. Se o prefeito não construir outra casa com a verba, né? resenhou a lavadeira sobre a fama nada delicada do gestor da cidade. Uma gaitada maestra de um coro de risada quebrava o quase silêncio na lajinha.  

E assim corria do dia. Logo um mar de tecidos multicores preenchia o capim a secar. O calor cuidaria dessa providência. As lavadeiras aproveitavam para acentuar as prosas e algumas mais fogosas lançavam nas águas, numa farra serena e pura de outras épocas. A tarde queria correr pra noite e todas recolhiam as vestes de sua responsabilidade e novamente se via o cortejo retornando pela picada até a cidade, vagaroso e alegre. 

A Lajinha se foi. A força das serras foi retida pela Barragem de Caianinha. As águas límpidas que corriam se misturam ao esgoto e estão condenadas à morte. Passou um tempo, a energia chegou, muitas das lavadeiras – inclusive Maria - já lavam roupas nos jardins do Céu.

 

 

 

 

Publicado por Antônio Oliveira - Redação BCN - o Blog da Terra da Romaria!

Nenhum comentário